2011年11月19日土曜日

伊藤周三氏 (3)

娘理奈に伊藤さんが亡くなったことを知らせると何か自分も彼のことを書いて残したいと言ってきた。物心ついたころから伊藤さんを知っている。「Jornal Memai」(http://www.jornalmemai.com.br)に自分が受け持っているコラムがありそこに載せるから彼の写真がないかと言ってきたのでこのブログの2008年の5月28日のにあると伝えた。2,3日したら次の新聞にのせる原稿を書いたから送っているけど一度読んで感想を聞かせてくれとのメールが入ったので下に記す。私としては相手に届きそうで届かないお互いに相手を思う日本人の心のすれ違いとでもいえるエピソードでうまく書けてるよと伝えた。最後の文、「お釈迦様はほほえんでいた」で何かそのことがお釈迦様の手のひらの中で起こっているような錯覚さえ覚える。

O Jardineiro, o Monge e o Paradoxo dos Corações Puros

Às vezes, e não poucas vezes, nos deparamos com histórias tão incríveis que desafiam nossa noção de realidade, nossa crença naquilo que acreditamos ser possível ou factível. Nessas horas, se não temos uma base para apoiar nossa fé, a história corre o risco de se perder no eco das fábulas e dos contos de fadas. Feita a observação, vou relatar uma história em que só acredito porque conheci pessoalmente os personagens – figuras fantásticas e reais.
São dois amigos de meus pais. O primeiro é um senhor japonês, sempre risonho, que fazia o melhor tofu do mundo. Ele foi padrinho de casamento de meus pais e faleceu recentemente, aos 83 anos. O segundo é um monge budista que conheço desde criança.
Pois bem, ambos são duas das pessoas mais bondosas que conheci, donos de uma generosidade tão grande quanto discreta. Sabe aquela pessoa que não sabe o que fazer ou falar depois de um “obrigado”, e que fica visivelmente desconfortável quando enaltecemos suas qualidades? Pois é: os dois se encaixam no perfil.
Um dia, minha mãe os apresentou e, desde então, o fabricante de tofu - que também ensinava as pessoas a produzirem seu próprio adubo orgânico (“quase mágico!”, como diria ela) – passou a ir ao Mosteiro de duas a três vezes por semana. Para cuidar do adubo e, por consequência, da horta e das plantas do lugar. Ele pegava o carro, dirigia por aproximadamente uma hora e passava o dia todo em meio à areia, ao adubo, ao suor e aos próprios sonhos. Depois, com o mesmo sorriso, tomava banho e ia embora, normalmente sem avisar ou mesmo avistar o monge.
Uma atitude tão generosa não poderia passar despercebida. Mesmo sem encontrar o bom jardineiro, o monge testemunhava o crescimento das plantas, a renovação dos canteiros e da reserva de adubo. E, assim, muitos meses transcorreram. E a natureza sorria!
Como o senhor do tofu já não era moço – passava dos setenta anos nessa época -, às vezes se cansava um pouco mais do que deveria. Ainda assim, percebia-se sua alegria por estar ali, fazendo o que sabia fazer. Tenho certeza de que isso o fazia se sentir em casa, de uma forma que só as pessoas que trabalham com a terra são capazes de experimentar. Em minha lembrança, aliás, sua figura é a de um senhorzinho andando na cidade (no supermercado, correio ou banco), meio perdido em pensamentos, de galochas pretas de agricultor, chapéu de palha e camisa suja de terra – completamente alheio aos olhares curiosos.
Um dia, após algum tempo, o monge o chamou. Disse-lhe que a pequena horta era incrível, agradeceu-lhe o esforço e a dedicação. Afinal, tamanha doação não tinha preço! Mas sentia que, de algum modo – muito mais sabendo de seu sacrifício -, precisava retribuir. E, assim, ofereceu-lhe um pequeno pedaço de terra na base do Mosteiro, onde ele poderia plantar o que quisesse – e o que lá fosse colhido seria só dele –, como demonstração, mais simbólica do que real, de sua gratidão.
Segundo minha mãe, o padrinho voltou triste para casa naquele dia. Nunca mais retornou para cuidar da horta comunitária, apesar de, às vezes, ainda visitar o Mosteiro.
Por que não retornou? Por que não aceitou o presente? Várias vezes me fiz essa pergunta e, há pouco tempo, tomada de coragem, perguntei aos meus pais. Conto-lhes o que me contaram.
“O padrinho se sentiu culpado por gerar preocupação no monge” disse minha mãe. – “Mas, como assim?”, perguntei. “Ele não queria que o monge se incomodasse com sua presença ou com qualquer retribuição. Por isso, não voltou mais” respondeu. E quanto ao monge? O monge, em sua benevolência, não queria explorar o trabalho do padrinho e, por isso, havia decidido ceder-lhe um pedaço de terra. Além disso, pensava, o bom jardineiro não teria que viajar toda a semana somente para ajudá-lo.
Ao ouvir a explicação, não pude deixar de pensar na complexidade do coração humano. Não é que duas intenções tão puras e generosas, tão belas, acabaram produzindo um paradoxo? Enquanto isso, imagino, o Buda sorri...


Lina Saheki (saheki.lina@gmail.com) é diretora do Centro Cultural Tomodachi, professora de japonês e mestre em Direitos Humanos. Em outubro de 2011 foi contemplada com o Prêmio Crisóstomo Arns por sua atuação na área da cultura e educação.

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